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12 setembro 2005

memória.doc

A memória é algo engraçado...
Não consigo me lembrar no momento se fechei o vidro do carro a meia hora atrás, mas lembro com uma certa facilidade de brincar de lego na sala da casa da minha avó aos três anos de idade. Essa memória é especial porque, ao menos como me lembro, foi esse o primeiro dia que tomei consciência de mim mesmo. Foi ali que percebi que pensava, que era um ser diferente dos demais seres ao meu redor e lembro de ter pensado com minha cabecinha de três anos de idade: “Nossa, eu penso.”...
Talvez não tenha pensado tudo que ache que eu pensei. É uma das graças da memória... ela não é um retrato fiel do que aconteceu na época, talvez por ser algo que parta do presente e não do passado. A memória dos meus três anos de idade só faz sentido para mim agora aos vinte um anos...
Um dos piores acidentes que sofri ocorreu com sete anos de idade. Eu me lembro bem do dia, me lembro do acontecimento, de tudo o que ocorreu... mas não lembro da dor. O estranho é que em relação a um acidente que sofri aos dezesseis anos de idade, que me deixou algumas cicatrizes, ao rememora-lo eu sinto um mal estar e uma espécie de dor psicossomática nos pontos onde ainda tenho essas cicatrizes. Sobretudo no meu ombro direito, que também é onde está a cicatriz do meu acidente aos sete anos de idade... Porque diabos eu lembro da dor de um e não de outro? Será que só se passa a entender o que é dor com a idade, ou será que um evento foi mais traumático que o outro? Eu não sei explicar. Talvez ninguém saiba.
Existem certos eventos da minha infância e adolescência que estão constantemente na minha cabeça, enquanto outros, tão importantes quanto se esvaem dela como... acho que é possível colocar algo poeticamente p.i.m.b.a nesse trecho... como uma folha ao léu no vento da primavera. Espero ter feito jus aos pimbas dos anos 80. Afinal, os pimbas são um movimento dos anos 80, por mais que existam jabores e mainardis hoje eles nunca chegarão a capacidade de dizer nada com 80 linhas que possuíam Renato Russo, Os Engenheiros de Havaí e seus congêneres...
Alias, algo que anda me irritando muito é a atual e constante apologia aos anos 80 que se configura no Brasil. O chute no último pau que sustentava a barraca do bom senso nesse sentido para mim foi darem um programa de rádio para o Leo Jaime comandar. Aonde isso vai parar? Em uma reunião dos New Kids on the Block no episódio inaugural do “novo Show do Fofão”, seguido de uma maratona de Topo Gígio, Caverna do Dragão, e Smurfs, claro, tudo acompanhado ao lado de seu Genius e do demoníaco Pogo-Bol...
Talvez sejam apenas os adultos de hoje lembrando de uma época mágica, onde não existiam contas para pagar, onde não existiam problemas e a grande preocupação da vida era chegar em casa a tempo de assistir Jaspion ou Zilion. Adultos que não lembram da morte de Tancredo, da posse de Sarney, do brilhante plano de congelamento de preços, da extorsão, da inflação, da crise econômica, da corrida armamentista e de tudo o mais. Ou se lembram, uma memória não é ligada a outra. A memória nesse caso parece guardar as boas lembranças em um local bem distante das outras coisas, para que as más memórias não as atrapalhem... Meus acidentes não fizeram eu esquecer de como foi bom ficar um mês em casa jogando videogame por causa de uma clavícula quebrada, nem da mentira que meus amigos espalharam pela escola no colegial de que eu não vinha mais para a escola porque tinha morrido. A cara do professor de português ao me ver vivo uma semana depois nunca vai sair da minha cabeça...Acho que é normal privilegiar as boas experiências e tentar a todo custo esquecer as más, faz parte da cultura ocidental, e talvez até da humanidade, acho. Por um lado talvez isso gere seres humanos mais felizes, ao menos aparentemente, mas se a memória é tão importante na constituição de quem somos e como pensamos, não estaríamos com isso abrindo mão de uma boa parte dela? É provável que não... A memória parece ser um demônio seletivo, chato e bobo as vezes, sim bobo, porque brinca conosco ao deixar que pensemos que podemos lembrar apenas do que quisermos... todos eventos traumáticos da minha vida estão aqui, límpidos e claros como no dia em que ocorreram e não importa o que eu faça eles não saem daqui, a saída em parte é aprender a conviver com eles e parar de tentar apaga-los como se nunca tivessem existido... essa reflexão, eu sei, é um tanto pimba de boteco da minha parte... Seria reconfortante falar agora que o que eu quero mostrar na verdade é alguma coisa com sentido, mas o pior é que eu não quero mostrar nada, eu não tenho um ponto a provar, eu queria apenas lembrar... Esse é um final um tanto quanto baixo e barato, para não dizer melodramático, mas deturpando uma frase de uma autora a qual muito admiro: “É tempo de abacaxi.” (E o sentido é bem parecido também...)


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Remember me (?)



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pois é milton, só lembramos do que queremos lembrar, não tem jeito...

adorei seus textos,
mas me deixou meio louca,
vc e esses seus pensamentos...
tsc tsc tsc!
depois de ler fiquei aqui meio besta pensando em várias coisas...
Parabéns,
o texto ficou "supimpa"!

passarei por aqui quando lembrar,
ou quando vc mandar!

x]

muito bom, de verdade. pelos seus textos tenho notado cada vez mais que somos parecidos. e já tinha chegado à essa conclusão com o Rafa e com o Manteiga. isso significa que o Manteiga pode ser gay, você pode ser trombadinha, o Rafa pode ser gordo e eu posso ser psicótico. medo.

como eu te disse, eu ainda vou escrever sobre seu texto =]

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